Em julho, os caingangues do oeste de Santa Catarina vão trocar a festa do terceiro aniversário de Vitor Pinto por um rito em homenagem aos mortos. Até lá, seus pais, Sônia, de 27 anos, e Arcelino, de 42, esperam ver a condenação de um assassino. Mas a morte do menino de 2 anos, degolado com uma lâmina no pescoço no dia 30, por um homem que fingiu afagar seu rosto enquanto sua mãe o amamentava na rodoviária de Imbituba, é vista pela comunidade indígena como mais um marco em sua trajetória de perdas e de abandono pela sociedade. “Ser índio no Sul é, na versão hardcore do senso comum, ser vagabundo; é contar com a tutela generosa da Fundação Nacional do Índio (Funai). Só quando viram que os próprios índios começaram a se movimentar é que o caso foi ganhando visibilidade, até pelo descaso”, afirma Leonel Piovezana, professor dos Programas de Mestrado em Políticas Sociais e Dinâmicas Regionais e de Educação da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (SC).
Natural da Aldeia Condá, em Chapecó, a família tinha ido para o litoral, onde há mais movimento no verão, para vender o artesanato da tribo, como faz todo fim de ano. “Não somos bandidos, somos trabalhadores. Temos de fazer o que sabemos, o que é da nossa cultura, como o balaio e o artesanato para vender. É uma questão de sobrevivência”, afirma a avó de Vitor, Teresa, com olhar perdido, e lágrimas no rosto, após cerimônia pelo sétimo dia da morte. Acostumada com a presença da criança pela casa, a senhora que nem lembra a própria idade – “Acho que tenho 70 anos” -, quando soube do assassinato do neto pensou até em abandonar a casa. Os pais de Vitor, que tinham desembarcado na rodoviária um dia após o Natal, também ainda vivem “em choque”.