O risco iminente de rompimento da barragem da Mina de Gongo Soco, em Barão de Cocais (MG), tem deixado cada vez mais tensos os moradores da região. Segundo a coordenadora nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), Maria Júlia Andrade, a maior preocupação é com a possibilidade de o rompimento de um talude gerar uma movimentação sísmica que comprometa de vez a barragem.
De acordo com a coordenadora, a forma como as informações estão sendo repassadas pela Vale é inadequada, o que tem gerado “pânico e terror” na população local. Maria Júlia diz que há uma preocupação muito grande, nos últimos dias, após ter vindo à tona a informação de que existe um talude da cava da mina prestes a desmoronar.
“Este problema já existia, mas ele só veio à tona agora. E o maior problema é que esta cava está localizada muito perto, cerca de 300 metros, da barragem que já estava em risco máximo há mais de três meses”, disse a coordenadora.
Na avaliação do MAM, “as informações [sobre os riscos] são dadas a conta-gotas, e o pânico e o terror estão generalizados [na região]. As pessoas não sabem se o risco é real, não sabem se a barragem vai romper ou não. Só sabem que existe um pânico e um medo de uma bomba relógio em cima de suas cabeças”, disse.
A reportagem da Agência Brasil não conseguiu contatar a assessoria da Vale até o fechamento desta matéria.
Preocupação
Dono de um hotel e de uma loja de utilidades e presentes localizadas na área de risco, o empresário Luís Felipe Eboli disse que a maioria das pessoas que vivem na região têm dito que o município de Barão de Cocais “vai acabar”.
“A população já sabe que a cidade em si não vai existir mais. Uma maré de lama vai envolver a cidade toda. Muitos já pensam no que fazer depois, sabendo que o turismo deixará de existir, bem como a atividade minerária. A cidade pode sucumbir. Portanto não há o que fazer. Todos os comerciantes estão preocupados. Ninguém tem coragem de investir desde quando teve esse alarme indicando a possibilidade de rompimento da barragem. A cidade parou”, disse o empresário.
Simulação
Ontem (18), foi feita uma simulação de emergência que reuniu cerca de 1,6 mil pessoas, número que representa 26,75% das mais de 6 mil pessoas que eram esperadas. Essa foi a segunda simulação de evacuação na cidade. O objetivo da atividade foi reforçar as orientações e o treinamento da população residente na Zona de Segurança Secundária do município. Eles receberam instruções de como proceder em caso de emergência com a barragem Sul Superior da mina Gongo Soco.
Segundo o Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG), a barragem pode se romper entre hoje (19) e 25 de maio. Diante da situação, os procuradores fizeram recomendações para que a mineradora Vale adotasse “imediatamente” uma série de medidas para deixar claro à população de Barão de Cocais sobre os riscos de rompimento da barragem de mineração Sul Superior, da Mina de Gongo Soco.
De acordo com a nota do MPMG, a Vale deve comunicar “por meio de carros de som, jornais e rádios, informações claras, completas e verídicas” sobre a condição estrutural da barragem, além de fornecer “total apoio logístico, psicológico, médico, bem como insumos, alimentação, medicação, transporte e tudo que for necessário” às pessoas eventualmente atingidas.
Segundo o Ministério Público, a mineradora não apresentou o estudo dos impactos relacionados ao eventual rompimento das estruturas da Mina de Gongo Soco.
Defesa Civil
De acordo com o integrante da coordenadoria geral de Defesa Civil, tenente Flávio Fagundes, há 7 pontos de encontros previamente definidos pela Defesa Civil e pela própria empresa, para onde essas 6 mil pessoas devem se dirigir ao ouvir o sinal de alarme dos carros de som. Segundo ele, a retirada das pessoas, a partir desses pontos, será feita por meio dos veículos de transporte fornecidos pela Vale.
Fagundes acrescenta ter identificado 44 pessoas que terão mais dificuldades para deixarem os locais, por conta de terem algum tipo de deficiência ou dificuldade de locomoção. “Treze delas já estão locadas em áreas seguras”, informou o tenente, que esteve em Cocais e participou do simulado.
Segundo ele, apesar de a rotina da cidade ter sido alterada, os serviços essenciais continuam funcionando normalmente. “Tivemos a desativação de alguns postos de saúde e escolas que foram remanejados para outros estabelecimentos. A vida continua, ainda que de uma forma apreensiva”.
Barreira
A mineradora Vale iniciou na última quinta-feira (16) a construção de uma contenção de concreto, que vai funcionar como uma barreira física caso haja rompimento da barragem. Em nota, a Vale informou que iniciou a terraplenagem para a construção da barreira, a 6 quilômetros da barragem.
“Além dessa estrutura que, após concluída, fará a retenção de grande parte do volume de rejeitos da barragem Sul Superior em caso de rompimento, a Vale está realizando intervenções de terraplenagem, contenções com telas metálicas e posicionamento de blocos de granito. Essa obra atuará como barreira física no sentido de reduzir a velocidade de avanço de uma possível mancha, contendo o espalhamento do material a uma área mais restrita”, diz a mineradora.
Evacuação
A barragem Sul Superior é uma das mais de 30 estruturas da Vale que foram interditadas após a tragédia de Brumadinho (MG), ocorrida em 25 de janeiro. Em diversos casos, a interdição foi acompanhada da evacuação das zonas de autossalvamento, isto é, aquelas áreas que seriam alagadas em menos de 30 minutos ou que estão situadas a uma distância de menos de 10 quilômetros. Atualmente, mais de mil pessoas estão fora de suas casas em todo o estado.
Barão de Cocais é o município com o maior número de casas evacuadas. A evacuação teve início no dia 8 de fevereiro quando a barragem Sul Superior atingiu o nível 2 e as famílias foram levadas para quartos de pousadas e hotéis custeados pela Vale. Em 22 de março, a barragem Sul Superior se tornou a primeira a atingir o nível 3, que é considerado o alerta máximo e significa risco iminente de rompimento. Desde a tragédia de Brumadinho, quatro barragens da Vale em Minas Gerais alcançaram esse alerta máximo.
Fonte: Pedro Peduzzi – Repórter da Agência Brasil