A coleta e a análise de dados se tornaram uma realidade não somente na economia, mas em diversas áreas. Para especialistas, também na educação, esse tipo de prática pode contribuir para identificar problemas e orientar a ação de gestores, profissionais e governantes tanto na administração escolar quanto na elaboração de políticas públicas.
O tema foi discutido no evento Data Meeting Brazil, realizado em Brasília hoje (26). A professora de administração da Universidade de São Paulo (USP) Alessandra Montini destacou que, atualmente, há muitos dados disponíveis e o desafio é extrair deles valor para instituições e benefícios para a sociedade.
“A questão é como fazer para captar essa quantidade de informação. O número de dispositivos aumenta, o carro está conectado, até a TV desligada está conectada. Isso é possível porque há muito processamento. Hoje, nosso smartphone é muito mais poderoso do que o computador que levou homem pra lua. O desafio é como eu vou usar essa informação para tomada de decisão”, ressaltou a docente.
Na avaliação do gerente de políticas do movimento Todos pela Educação, Gabriel Corrêa, o trabalho orientado por dados pode ajudar de diversas formas no setor. A primeira é reconhecendo o que funciona. Entre 2007 e 2017, por exemplo, os percentuais de alunos do 5o ano com aprendizagem satisfatória em língua portuguesa e matemática mais que dobraram, saindo, respectivamente, de 28% para 60,7% e de 23,7% para 48,9%.
Outro exemplo é o acesso à escola. Na década de 1970, o índice estava na casa dos 48%. Atualmente, os jovens em idade obrigatória (4-17 anos) matriculados nos ensinos fundamental e médio chegam a 96,8%. “Um montante de dados, quando bem utilizado, pode virar política pública e impactar a vida dos professores e alunos brasileiros”, sugeriu Gabriel Corrêa.
Por outro lado, a análise de registros sobre serviços educacionais também permite mapear problemas. No ensino médio, por exemplo, 28% dos jovens estão dois ou mais anos atrasados, enquanto 60% dos alunos que concluem o ensino fundamental não têm o aprendizado considerado adequado.
Corrêa acrescentou que a análise de informações permite comparar governos “sem ideologia, com base em resultados”. O integrante do movimento citou ainda desempenhos desiguais entre estados. Entre 2007 e 2017, “se tomado o aprendizado adequado em língua portuguesa, o Ceará cresceu 44 pontos percentuais, enquanto o Maranhão evoluiu apenas 8”, exemplificou. Por outro lado, enquanto o Maranhão teve, em 2015, R$ 3,4 mil para gastar por aluno, São Paulo investiu R$ 6,5 mil por estudante no mesmo ano.
Outra forma de atuação apoiada em dados no setor é o acompanhamento de alunos. Em São Paulo, o governo elaborou uma ferramenta que ganhou o nome de foco aprendizagem. Por meio da análise da atuação do estudante, ela traça um perfil individualizado a cada professor, inclusive recomendando formas de reparar ou ajudar alunos que apresentem dificuldades a estimular habilidades.
Privacidade
A advogada Elaine Keller alertou que, embora o uso da tecnologia traga facilidades, ele também envolve ameaças, como à privacidade. Recentemente, o Brasil aprovou sua Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018), prevista para entrar em vigor em agosto do próximo ano. Em um cenário em que plataformas sabem mais sobre as pessoas do que elas mesmas, continuou a advogada, normas protegendo os dados dos indivíduos são fundamentais – e isso inclui a coleta de dados também na área da educação.
“A gente joga ao vento nossos dados e não sabemos qual será o uso, por quanto tempo e onde será armazenado. Isso abre a janela da privacidade e pode ter efeitos maléficos. Pessoas podem usar isso contra os usuários. Por isso, a lei é tão importante, pois obriga que empresas informem a finalidade, como será o armazenado e até quando será usado. É preciso ter proteção à privacidade e à ética”, defendeu Keller.
Edição: Paula Laboissière