Mais uma reunião realizada pela regional da Defensoria Pública do Estado Bahia com apoio dos Cras na articulação para a formação da Associação “Mãos que Reciclam”, aconteceu na terça-feira (19), no Centro de Referência de Assistência Social (Cras) Jardim Valéria, com a participação de cerca de 70 catadores desses materiais.
“Nós temos apenas uma associação e prestamos o atendimento aos catadores de materiais recicláveis em seus territórios, para que eles possam exercer seu trabalho de forma efetiva e, para isso, contamos com o apoio dos Cras”, explicou a defensora pública, Kaliany Gonzaga, que informou que, atualmente já foram identificados 450 catadores, mas a Defensoria tem uma estimativa de que sejam mais de 600 no município.
Segundo a gerente do Cras, Sheila Cristina Portela, os catadores de materiais recicláveis compõem um grupo prioritário para atendimento da política pública de Assistência Social. “Além de colaborarmos com este trabalho da Defensoria, estamos inscrevendo os catadores no Cras e nos serviços, programas e projetos que são ofertados na unidade, como a inscrição ou atualização do Cadastro Único, inserção no Serviço de Atendimento Integral à Família – PAIF, no Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, no Programa Acessuas Trabalho, entre outros, conforme a necessidade da família”.
Durante a reunião, os catadores foram cadastrados na associação e escolheram dois representantes, sendo Maida Santos Lima, uma das representantes, a qual trabalha com reciclados há mais de cinco anos. Para ela, a iniciativa irá contribuir para o trabalho dos catadores da sua região. “Acredito que a associação vai ajudar a gente a desenvolver mais o nosso trabalho”, avaliou Maida.
A recomendação aponta a necessidade da administração pública elaborar um Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PMGRIS). O documento destaca ainda importância de que seja implementada esta política pública ambiental com inclusão socioeconômica de catadoras e catadores de materiais recicláveis.
Com dez pontos listados, a recomendação foi elaborada conjuntamente com a Defensoria Pública da União e os Ministérios Públicos Federal e do Trabalho e ressalta as exigências executivas previstas na lei federal n° 12.305/2010 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos. A mesma iniciativa, para cumprimento do que está previsto na lei, tem sido articulada pela DPE/BA em outros municípios do estado.
De acordo com a coordenadora do Núcleo de Gestão Ambiental da DPE/BA e do programa “Mãos que Reciclam” em Vitória da Conquista, defensora pública Kaliany Gonzaga, embora não seja efetiva na grande maioria dos municípios brasileiros, a coleta seletiva, trabalho que segue realizado em condições precárias pelos catadores(as), já deveria estar implementada nas cidades brasileiras desde que a lei entrou em vigor.
“A depender da população dos municípios, a criação dos aterros sanitários ganhou prazos maiores com o novo marco do saneamento. Mas a coleta seletiva não está vinculada a isto. Ela é obrigatória desde a entrada em vigor da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Todo município deve se planejar e instituir seus planos. Ainda que não tenha o PMGIRS, é obrigado a realizar coleta seletiva para que apenas rejeitos, não resíduos, sigam para os aterros ou lixões, quando ainda se tratar destes. E quem tem prioridade para realizar esta gestão dos resíduos é a categoria de catadoras e catadores”, explicou Kaliany Gonzaga.
Maioria de catadores em Vitória da Conquista é negra e ganha no máximo R$ 500 reais mensais
A Defensoria da Bahia analisou perfil socioeconômico de 347 catadores do município de Vitória da Conquista este ano. O estudo concluído e divulgado em julho, mostrou que 83,5% dos catadores são negros e pardos.
“A gente sai e deixa os filhos com fome, como várias vezes já aconteceu lá em casa de não ter nem um quilo de arroz. Vai trabalhar debaixo de chuva e sol e não reclama de nada”, desabafa a catadora Aparecida Batista Silva, mulher, negra, de meia idade, que tira o sustento da família catando latinhas, plásticos, papéis e recicláveis em geral, em Vitória da Conquista.
A pele castigada pelo sol, as marcas de cortes nas mãos, a incerteza se haverá dinheiro para comprar a comida para os filhos no dia seguinte, o envelhecimento precoce por causa da má qualidade de vida. Pretos, pobres, discriminados, com idade avançada: essa é a realidade de grande parte da categoria de catadores na região.
Também chama a atenção que a maioria têm renda mensal familiar de no máximo R$ 500 reais (57%).
“Os catadores são prestadores de serviço público de manejo de resíduos e coleta seletiva, mas, via de regra, não recebem adequado apoio dos gestores públicos municipais. O catador é protagonista na cadeia produtiva da reciclagem; toda ela se sustenta por meio da exploração do trabalho deles”, declara a defensora pública Kaliany Gonzaga, que coordena o Nugam e o programa Mãos que Reciclam.
De acordo com Kaliany, a Defensoria da Bahia tem atuado intensivamente para esclarecer os direitos, estimular a organização dos catadores em associações de coleta e criar oportunidades e soluções para implantação de coleta seletiva de baixo custo – o que ajudaria bastante na emancipação da categoria.
Ciente dessa vulnerabilidade, durante a pandemia do coronavírus, a Defensoria baiana, além da assistência jurídica à categoria, está distribuindo milhares de cestas básicas, em uma parceria com o Fórum de Catadoras e Catadores de Rua em Situação de Rua e com o Ministério Público do Trabalho – MPT, beneficiando famílias de catadores, pessoas em situação de rua e mulheres em vulnerabilidade social.
De acordo com a presidente do Fórum de Catadoras e Catadores de Rua em Situação de Rua, Annemone Paz, desde o início da pandemia estão sendo feitas várias reuniões com órgãos públicos para diminuir a vulnerabilidade da categoria durante o isolamento social. O Fórum é quem articula o contato entre a Defensoria e os catadores, a fim de verificar as condições socioeconômicas deles em Salvador.
“O Fórum entendeu que a gente devia ir pra rua escutar os catadores nesse momento mais difícil, que se pede para ficar em casa. Fomos pela escuta, para ver de perto o que está acontecendo com eles. Fizemos essa busca ativa muito pertinente, escutando os catadores por territórios, que envolve toda a Salvador. Com muito trabalho conseguimos essa quantidade de 174, mas tem muito mais para atender”, explica Annemone.
*Com informações da Ascom da PMVC e da Defensoria Pública