Foram identificados os suspeitos de assassinarem Bernadete Pacífico, liderança quilombola baiana e coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq), com 12 tiros dentro da associação do Quilombo Pitanga dos Palmares, morta no último dia 17.
A informação foi divulgada nesta quinta-feira (31) pelo secretário de segurança da Bahia, em exercício, Marcel de Oliveira.”Eu posso garantir que a investigação está bem adiantada, com autorias definidas e com prováveis motivações conhecidas. No entanto, a investigação tramita em sigilo, mas pode ter certeza que a família vai ter o resultado que ela precisa e merece receber em pouco tempo”, afirmou.
De acordo com Marcel de Oliveira, mais detalhes serão mantidos em sigilo para não atrapalhar as investigações. “A gente não pode antecipar muito para não atrapalhar as investigações, mas de fato é uma área conflagrada, que tem muitos interesses permeando. A Mãe Bernadete era uma pessoa combativa, que não se aquietava com as coisas erradas que presenciava”.
Na quarta-feira (30), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) informou que o assassinato da líder quilombola Mãe Bernadete, e do filho dela, ocorrido em 2017, serão acompanhados pelo Observatório das Causas de Grande Repercussão. O colegiado é formado pela entidade e pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Ainda na quarta, o advogado David Mendez, que representa a família de Mãe Bernadete, pediu para ser beneficiado no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do Governo Federal.
O assassinato da líder religiosa ganhou grande repercussão e chamou atenção para a reincidência de casos como esse na Bahia. De acordo com levantamento da Rede de Observatórios de Segurança, realizado com apoio das secretarias de segurança pública estaduais e divulgado em junho deste ano, a Bahia e o segundo estado do Brasil com mais ocorrências de violência contra povos e comunidades tradicionais, só no período de 2017 a 2022 foram registrados 428 vítimas, atrás apenas do Pará.
Entenda o crime
Criminosos teriam invadido o terreiro da comunidade, feito familiares reféns e executado Mãe Bernadete a tiros. Ela é mãe de Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, mais conhecido como Binho do Quilombo, assassinado há quase seis anos, no dia 19 de setembro de 2017.
Antes de ser assassinada, Mãe Bernadete pensou que os dois homens que invadiram a casa dela eram assaltantes. A informação foi dada à polícia pelo neto da vítima, Wellington Gabriel de Jesus dos Santos, que estava na casa da avó, dentro do quilombo Pitanga dos Palmares, na noite do crime.
De acordo com o G1, a vítima estava na companhia de três netos quando foi morta: Wellington, de 22 anos, que estava em um dos quartos da casa, e dois adolescentes de 13 e 12 anos, que estavam na sala com a avó. Ao ouvir batidas na porta, um dos adolescentes a abriu e os suspeitos entraram na residência.
“É assalto?”, perguntou Mãe Bernadete quando os dois homens armados, com capacetes de motociclista, a renderam.
Ainda segundo Wellington, os homens pegaram o celular da avó e a mandaram desbloquear o aparelho. Eles também roubaram os celulares dos dois adolescentes que estavam na sala e exigiram que eles fossem para um dos quartos da casa.
Depois disso, um dos homens foi até o quarto onde Wellington estava e o mandou deitar no chão. “Deite no chão, seu ‘viado'”, exigiu. Ao sair do cômodo, o homem fechou a porta. Em seguida, o jovem ouviu diversos disparos. Quando saiu do quarto, encontrou a avó morta no chão da sala.
Sem telefone, Wellington utilizou o aplicativo de mensagens que estava aberto em seu computador para pedir socorro para pessoas que vivem no quilombo. Depois disso, ele deixou os familiares adolescentes com um vizinho e foi até o terreiro de Candomblé, que fica dentro do Pitanga dos Palmares, para ligar para a polícia.
Os suspeitos chegaram e saíram do quilombo de moto. Segundo Wellington relatou no depoimento, eles tinham entre 20 e 25 anos, eram negros e usavam roupas pretas, capas de chuva e capacetes.
Linhas de investigação
O governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues, afirmou na segunda-feira que a Polícia Civil trabalha com três teses para o assassinato de Bernadete Pacífico.
De acordo com Jerônimo, as hipóteses de briga por território e intolerância religiosa são investigadas, mas a mais destacada pela Polícia Civil da Bahia é a de disputa de facções criminosas – uma tese bem divergente da apontada por especialistas em conflitos envolvendo quilombolas e pelos advogados da família de Bernadete.
O governador não explicou a relação do assassinato de Bernadete com o tráfico de drogas, já que a ialorixá e líder quilombola não tinha envolvimento com a criminalidade. Além disso, ela relatava, frequentemente, as ameaças que recebia de grileiros e madeireiros, que queriam extrair matéria prima ilegalmente na região do Quilombo Pitanga de Palmares, Área de Proteção Ambiental (APA) em que ela morava.