Foram 17 anos de pesquisa, incontáveis horas em laboratórios, milhares de testes, histórias incríveis de recuperação, além do investimento financeiro, para colocar no mercado um produto desenvolvido na Universidade Federal de Viçosa (UFV). A pomada de urucum, como vem sendo popularmente chamada, promete (e parece cumprir) curar feridas de difícil cicatrização como psoríase, queimaduras, escaras e dermatites. Entre os seus feitos grandiosos está a eficácia no tratamento de feridas de pacientes com diabetes mellitus, já que um machucado no pé de uma pessoa que tem a doença pode se tornar um problema muito grave com risco de amputação. “O passo mais curto para se chegar a uma inovação dentro da universidade é aproveitar o conhecimento popular”, afirma o professor titular do Departamento de Tecnologia de Alimentos da (UFV), Paulo César Stringheta, que, junto com Aloísio José dos Reis, descobriram o potencial curativo dessa substância natural.
Essa história começou em 1999 quando Aloísio, ao manipular o urucum com as mãos machucadas, percebeu o efeito cicatrizante do produto. Foi então que ele procurou o professor universitário para relatar o acontecido. Paulo, que já trabalhava há muito tempo com extrato de urucum ficou instigado pela história e ambos se debruçaram nas sementes para obter o extrato bioativo natural. No início dessa trajetória, outro indício de que a dupla estava no caminho certo. Aloísio era dono de uma oficina mecânica e um de seus funcionários, ainda no início da pesquisa, se queimou em um escapamento de veículo. Ele então usou extrato de urucum – já manipulado por ele – para tratar o ferimento e verificou que, além de a dor cessar, a cicatrização foi rápida.
Os primeiros testes em animais, em 2004, foram realizados com o extrato puro de urucum e comparados com as duas pomadas de cicatrização mais utilizadas no mercado de fármacos para esse fim. “Para nossa surpresa constatamos, através de vários exames de bioquímica e também o exame visual, que a cicatrização era igual ou mais rápida que as dos fármacos. Foi aí que acendeu a ‘luzinha’ de que estávamos diante de um produto com eficácia”, conta Stringheta. Além disso, segundo o pesquisador, testes específicos mostraram que não houve alteração na bioquímica do sangue dos animais. Essa constatação era importante para descartar o risco de alergia, mesmo diante do urucum, o corante natural mais utilizado no mundo pela indústria alimentícia.
Foi então que ele e Aloísio começaram a distribuir o produto às pessoas e analisar os resultados. O professor Paulo César Stringheta explica que o extrato de urucum é extraído à base de álcool que na sequência é todo evaporado. Ou seja, não é utilizado solvente orgânico nessa extração. “Isso foi no final de 2005, início de 2006, e os resultados eram tão impressionantes que as pessoas começaram a nos procurar solicitando a pomada”, relembra.
Em 2006, foi criada a Profitus, empresa vinculada à Incubadora de Empresas de Base Tecnológica do CENTEV/UFV e o extrato foi patenteado. Depois disso, os recursos pessoais para tocar o desenvolvimento do produto acabaram e, até 2010, Paulo e Aloísio continuavam distribuindo as pomadas informalmente e acompanhando os resultados. Elas ficavam cada vez mais famosas em Viçosa e região. “Foram centenas, milhares de pessoas que acompanhamos nesse tempo”, afirma o professor da UFV.
Nesse longo percurso, eles chegaram até a desistir por não encontrarem investidores dispostos a bancar a ideia. “Nós sempre éramos convidados para seminários no Brasil e no exterior para apresentar a pesquisa, sem que isso ajudasse a viabilizar a chegada do produto ao mercado. Estávamos decidindo que liberaríamos a patente quando, em meados de 2015, um grupo nos procurou. Em agosto daquele ano, conseguimos o suficiente para produzir as pomadas. Mas foi em dezembro que um grande grupo decidiu investir e aportou o recurso necessário para a implantação da Profitus”, detalha.