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Semiárido brasileiro pode ficar ainda mais seco, quente e desertificado, conclui pesquisa

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Enquanto o mundo todo volta suas preocupações para conter o aquecimento do planeta, pesquisadores do Departamento de Solos (DPS) da Universidade Federal de Viçosa (UFV) dão uma contribuição importante para compreender o que as mudanças climáticas podem provocar no semiárido brasileiro.

Regiões já muito sofridas, como o Vale do Jequitinhonha e o Nordeste, poderão ficar ainda mais secas, quentes e desertificadas. As consequências serão sentidas na biodiversidade, nas culturas agrícolas e pela população, que, historicamente, foge da seca. Os resultados de uma tese de doutorado podem orientar políticas públicas para minimizar o problema ambiental e humanitário.

A tese foi defendida pelo pesquisador Guilherme de Castro Oliveira e os resultados publicados em um artigo na prestigiada revista científica Science of the Total EnvironmentA grande maioria dos demais autores deste artigo, professores e pesquisadores do DPS, integra um grupo que já acumula experiências em pesquisas que consideram os solos tropicais nos modelos de predição dos impactos das mudanças climáticas nos ecossistemas.

O trabalho dos pesquisadores alcança uma importância ainda maior neste momento em que o 6° Relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC/ONU), lançado este ano, mostrou, de forma irrefutável, que o aquecimento global está se desenvolvendo mais rápido do que o esperado.

As medidas para conter a emergência climática, definidas na COP26 – a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas que está acontecendo no Reino Unido – ainda não garantem sucesso nos esforços para a adaptação às previsíveis mudanças. Estudos como os que são realizados no Laboratório de Geoprocessamento do DPS (LabGeo), poderão, inclusive, compor os próximos relatórios sobre o tema, uma vez que estes se baseiam em pesquisas internacionais.

Guilherme Oliveira explica que as predições do que deve acontecer ao clima do planeta nos próximos anos são feitas através de modelos matemáticos e estatísticos muito complexos, denominados Modelos de Circulação Geral. Eles conseguem representar cenários futuros de acordo com a adoção ou não de medidas de mitigação de emissão de gases do efeito estufa.

A partir do comportamento do clima, os pesquisadores empregam técnicas de inteligência artificial (machine learning) e modelagem de nicho ambiental para prever a distribuição da vegetação ao longo dos próximos anos ou décadas. Mas só recentemente estes modelos passaram a considerar a variedade dos solos para explicar a geografia da vegetação, dando mais consistência às previsões. A equipe do DPS tem dado importantes contribuições ao considerar as características que são próprias aos solos tropicais.

“Com modelos ecologicamente mais robustos, podemos ter previsões mais realistas dos impactos das mudanças climáticas, tanto para a sociedade, quanto para a biodiversidade regional.”, disse Guilherme.

A pesquisa que gerou a tese e o artigo analisou como será a vegetação da região geopolítica do semiárido, que compreende o norte de Minas Gerais e os estados do Nordeste, exceto o Maranhão, nas próximas décadas. Além da Caatinga, mais de 40% do semiárido suporta os biomas Cerrado e Mata Atlântica e abriga cerca de 28 milhões de pessoas.

A região é reconhecidamente seca, pobre, e com tradição de grandes fluxos migratórios. Nos modelos utilizados, os pesquisadores incluíram as características dos solos desta região, que são rasos ou arenosos, com poucas condições de estocar água e manter a umidade do ambiente. A conclusão é que os eventos extremos, uma característica das mudanças climáticas, devem agravar as condições da região.

“A chuva se concentra em curtos períodos e encontra uma vegetação com pouca cobertura foliar, que não consegue proteger o solo da erosão. Os solos não têm capacidade de reter toda essa água que cai de uma vez. Se esses eventos forem frequentes, podem levar à desertificação”, afirmou Guilherme.

Com as mudanças no clima, estas áreas serão reduzidas, afetando, definitivamente, a biodiversidade dos biomas. Segundo Guilherme, num cenário mais otimista, de controle das emissões, como se espera, a extensão da Caatinga aumentaria cerca de 16% no semiárido, até o final deste século.

No cenário pessimista, esse aumento seria de 25% em relação à cobertura do bioma no início do século XX. “Este é um indicador preocupante para atividades como a agricultura, pecuária e o saneamento básico, aumentando ainda mais as dificuldades históricas da região”, disse ele.

A pesquisa aponta para a necessidade de haver esforços políticos para adaptação às mudanças no clima no semiárido. Para os autores, será preciso rever hábitos de grande impacto, como o pastejo na vegetação natural e as queimadas, que potencializam a perda de biodiversidade e impactam gravemente o solo.

Ainda será necessário considerar outras estratégias de mitigação, como o desenvolvimento de culturas mais adaptáveis à seca e opções para a sobrevivência das pessoas. Ainda segundo o artigo, a mudança na adequação ambiental de floresta para vegetação aberta e seca implica em uma grande perda para a biodiversidade, bem como compromete a provisão de serviços ecossistêmicos importantes para manter a economia e a subsistência da maior população semiárida do mundo.

“Prever as regiões mais suscetíveis às mudanças climáticas futuras é o primeiro passo no desenvolvimento de estratégias para mitigar os impactos nessas áreas”, concluiu Guilherme.

O grupo do LabgGeo é formado pelos professores Elpídio Inácio Fernandes Filho, Carlos Ernesto Reynaud Schaefer e Márcio Rocha Francelino, além de pesquisadores orientados pela equipe de professores.

Informações da UFV

Esta postagem foi publicada em 10 de novembro de 2021 07:53

Tiago Marques

Tiago Marques é redator e editor do site Agência Sertão. Trabalha com produção de conteúdo noticioso para rádio e internet desde 2015.

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