Em audiência na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional realizada terça-feira (6), representantes do governo defenderam o acordo de salvaguardas tecnológicas envolvendo a base de Alcântara (MA) com os Estados Unidos em análise pela casa legislativa. Já deputados se dividiram, com a oposição questionando pontos do trato e a base de apoio reforçando a necessidade de sua aprovação.
O acordo estabelece regras de proteção aos Estados Unidos no emprego de tecnologia deste país para atividades na base de Alcântara, cidade próxima à capital São Luís, como lançamento de foguetes ou de satélites. A redação detalha as condições de atuação de artefatos estadunidenses, incluindo as garantias de agentes do país estrangeiro e limitações à atuação de agentes brasileiros na região.
O presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB) e representante do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Carlos Moura, defendeu a aprovação pelo potencial econômico do mercado, que segundo o gestor envolve diversas atividades cotidianas, da operação de GPSs e informações meteorológicas até soluções necessárias ao agronegócio e às comunicações, como tecnologias de suporte à televisão e a serviços móveis.
“Há um crescimento vertiginoso deste mercado. Temos esta vantagem competitiva da costa norte, que é melhor comparada com outros. Temos melhorias feitas nos últimos anos. Estamos investindo na transformação do aeroporto que era militar para ser de uso compartilhado. E estamos trabalhando em arranjo jurídico que permita ao centro vender este tipo de serviço”, argumentou.
O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) colocou dúvidas sobre os termos do acordo e questionou se o objetivo é ser “eternos importadores” e não desenvolver tecnologia nacional. Um dos problemas, conforme o parlamentar, seria a vedação ao desenvolvimento de veículos lançadores. Outro, seriam restrições na celebração de acordos com outros países, situação na qual o país deveria manter as mesmas condições celebradas com os EUA.
“A ideia de que vai entrar dinheiro pela base de Alcântara não ficou clara, porque foi colocada na forma de desejo. Se nós entramos só com a base, não entramos nem com combustível, nem com veículo lançador, nem com satélite, estamos proibidos de desenvolver, como é que o Brasil vai arrecadar dinheiro desta massa prevista de até US$ 350 bilhões em 10 anos?”, indagou.
O representante do Ministério da Defesa, tenente-brigadeiro do ar Carlos de Almeida Júnior, respondeu que não há “queda de soberania porque não somos obrigados a fazer lançamento com satélites com tecnologia americana”. Ele disse que 80% da tecnologia na área é estadunidense e que não há limitações ao investimento no programa espacial brasileiro ou a novos acordos.
“Não estamos falando sobre acordo comercial. É de salvaguarda. É possível que no futuro um outro país nos exija um acordo de salvaguarda para tecnologia deles. Só há acordo vinculante quando se utilizar tecnologia norte-americana. No caso de outros países que vão fazer comércio conosco, se não estivermos falando de tecnologia norte-americana, não há o que se falar neste acordo aqui”, declarou.
Para o deputado Coronel Armando (PSL-SC), não há impactos negativos à soberania nacional com o acordo. Ele defendeu a proposta reforçando o argumento dos supostos benefícios econômicos advindos da exploração de serviços para o país e para o estado onde está sediada a base de Alcântara. Contudo, ele reconheceu que há itens da redação a serem melhor discutidas, embora não tenha detalhado quais.
“O Brasil precisa fazer as mudanças necessárias para se inserir no mercado internacional. O Maranhão é um estado atrasado que precisa de recursos para o seu desenvolvimento. Na minha visão de militar, este acordo é favorável ao nosso país. A soberania vai ser discutida, há pontos a serem ajustados, e é papel da Câmara, mas temos certeza que a visão por trás dele é desenvolver o país e ingressar em seleto clube de países que conseguem fazer lançamento de satélite”, afirmou.
Lições
A secretária de Controle Externo do Desenvolvimento Econômico do Tribunal de Contas da União, Andreia Oliveira, abordou a análise do órgão sobre o acordo de salvaguardas já celebrado com a Ucrânia. Ela ressaltou a necessidade de aprender com os erros desta iniciativa, especialmente no planejamento e impactos sociais.
“O acordo de salvaguarda que é um pré-requisito. Não tem como haver prosseguimento do programa espacial sem este pré-requisito. A outra questão é dar a devida atenção ao planejamento prévio. E fazer um tratamento prévio das implicações sociais dos projetos que vierem a ser feitos em Alcântara”, pontuou.
A preocupação com os impactos sociais, especialmente sobre as comunidades quilombolas da região, não apareceu tão fortemente nesta audiência, mas foi a tônica de outra, realizada na Comissão de Direitos Humanos e Minorias.
Tramitação
O acordo precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional para ter efetividade. A proposta é analisada no momento pela Câmara dos Deputados em três comissões. Caso tenha a votação favorável dos parlamentares na casa, deverá ser apreciada pelo Senado Federal.