A Câmara Municipal de Iuiu sediou nesta terça-feira, 4 de novembro, uma audiência pública considerada um marco histórico para o desenvolvimento do município e de toda a Região de Guanambi.
O evento, que deu continuidade às discussões iniciadas em Malhada pela manhã e precedeu os encontros em Palmas de Monte Alto e Guanambi, reuniu diversas lideranças políticas, empresários e a população para discutir o estudo de viabilidade e modelagem jurídica do Projeto de Irrigação do Vale do Iuiu.
O projeto, descrito como a “realização de um sonho antigo” que perdura há mais de 40 anos e como a “redenção” da região, é visto como a principal alternativa para gerar emprego e renda nos municípios incluídos na área do projeto.
Detalhes do Projeto e Viabilidade
O Projeto Vale do Iuiu é classificado como estratégico e prioritário pelo Governo Federal, sendo supervisionado pelo Ministério da Integração Nacional e tocado pela Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba).
A área estudada inicialmente abrangeu 96.000 hectares, com a expectativa de que a área irrigável efetiva fique na faixa de 60.000 a 71.000 hectares, com captação no Rio São Francisco, em Malhada, numa área entre a margem direita do Rio Verde Grande, divisor natural da Bahia com Minas Gerais. O projeto busca utilizar 100% de áreas já desmatadas, minimizando o impacto ambiental.
Sérgio Coelho, da Codevasf, destacou a viabilidade técnica do empreendimento, mencionando os solos de altíssima qualidade, considerados um dos melhores do Brasil e a topografia excelente da região. O traçado dos canais foi projetado de forma eficiente, com apenas quatro estações de bombeamento, elevando a água no máximo em 10 a 15 metros a cada etapa para canais longos e gravitários, alguns com até 35 quilômetros.
A infraestrutura hídrica e logística já existente (manancial do Rio São Francisco, BR-030 e a FIOL em construção) também favorecem o projeto.
Em termos financeiros, o investimento necessário é estimado em cerca de R$ 2 bilhões. Apesar do alto valor, o projeto seria extremamente vantajoso, pois geraria 71.000 empregos diretos (se irrigados 71 mil hectares) e resultaria em uma valorização imobiliária que pode gerar um retorno de R$ 5 bilhões, transformando terras que valem R$ 10.000 por hectare em áreas avaliadas em R$ 60.000 a R$ 80.000.
Modelagem e Cronograma
A modelagem atual é baseada em uma Parceria Público-Privada (PPP) por concessão, seguindo exemplos exitosos como o Projeto Baixio de Irecê (Bahia) e Jequitaí (Minas Gerais).
A Codevasf visa evitar atos desapropriatórios em massa para não desestabilizar o sistema fundiário. A proposta conceitual prevê que os produtores (pequenos, médios ou grandes) que desejarem participar do empreendimento cederão uma parte de suas terras, em percentual ainda a ser definido.
A Codevasf cederia essa terra ao investidor/concessionário que, por sua vez, financiaria a construção dos canais de captação e distribuição de água, estradas e energia, entregando a infraestrutura na porteira de cada propriedade.
Quanto ao cronograma, Sérgio Coelho informou que os estudos, ajustados com as sugestões das audiências, devem ser concluídos por volta de outubro de 2026. A concessão seria levada a leilão na bolsa de valores (em São Paulo) em janeiro de 2027, com o início das obras de construção previsto para o começo de 2027.
Principais Questionamentos e Respostas da Codevasf
A parte mais importante da audiência pública, segundo os organizadores, foi dedicada às perguntas da população. Os principais questionamentos centraram-se na inclusão dos pequenos agricultores e na garantia de continuidade do projeto.
Inclusão de Pequenos Produtores e Titulação:
O vereador de Urandi e secretário do STTR, Mateus Silveira, e os representantes locais Ezequiel e Joelson expressaram profunda preocupação com o destino dos pequenos agricultores. Eles temem que a história se repita, onde pequenos produtores foram afastados ou excluídos em projetos anteriores (como em Petrolina), especialmente aqueles sem titulação formal da terra (assentados ou quilombolas).
Sérgio Coelho garantiu que o objetivo é evitar a exclusão e a desestruturação da malha fundiária. A Codevasf está negociando com o Incra para regularizar áreas de assentamentos (Iuiu Sul). A ideia é que o pequeno agricultor permaneça na sua área.
Contudo, ele enfatizou que o projeto é de natureza empresarial e não puramente social, exigindo que os participantes sejam produtivos. Para garantir a inclusão, é crucial que o Governo Federal e as lideranças políticas criem uma linha de crédito que não exija garantias suplementares do pequeno agricultor, evitando a inadimplência no pagamento da tarifa de água e energia.
Ele defende que as áreas dos pequenos produtores (como 10 hectares) sejam dimensionadas para permitir que a família seja produtiva e alcance uma renda familiar de quatro a seis salários, tirando-os da dependência da Bolsa Família.
Faixa de canal e recusa em irrigar
Foi questionado o que acontece se um produtor não tiver interesse na irrigação, mesmo tendo o canal passando dentro de sua propriedade. Também se levantou a situação de propriedades muito pequenas (1/2 ou 1 hectare).
De acordo com Coelho, um produtor se recusar a participar (mesmo que seja um caso difícil de ocorrer devido à escassez de água), a Codevasf terá que indenizar a faixa do canal (faixa de servidão). A desapropriação da faixa é necessária para não interditar o projeto, que é de interesse da região. Para propriedades muito pequenas (1/2 ha), a solução pode ser desviar o canal ou usar tubulação, pois o projeto foca na produção em escala e não no lazer.
Risco de Continuidade Política
Preocupado com paralisações passadas (como o hiato após 2014, citado pelo Deputado Valdenor Pereira), o vereador Guima perguntou se uma eventual mudança no governo em 2027 poderia parar a execução do projeto após o leilão.
Os representantes da Codevasf asseguraram que, após a consolidação, leilão e assinatura do contrato de concessão com a empresa investidora, o contrato se torna “muito firme e forte”. O governo não poderia querer indenizar a empresa sem pagar um valor extremamente alto. Ele afirmou ter “zero” preocupação de que o projeto seja cancelado após o contrato ser assegurado.
A Codevasf informou está comprometida em construir um projeto de irrigação que, segundo o deputado Waldenor Pereira (PT), já recebeu a autorização e o “encantamento” do Presidente Lula. As lideranças presentes, incluindo prefeitos de Iuiu, Malhada, Palmas de Monte Alto e Guanambi, prometeram união política para marchar até Brasília, se necessário, e garantir a concretização do sonho do Vale do Iuiu.
